Quando de visita em museus, galerias, exposições, etc, é comum se ouvir "o que quis dizer o artista?".
É uma pergunta comum não só dos leigos. Efetivamente, o artista sempre quer dizer algo em todas as suas obras. Mas a mensagem que o trabalho traz não necessariamente é só do artista. Pode existir um contexto, um manifesto, uma declaração, uma queixa, uma piada até, no trabalho.
Criança que não brinca (2022)
Acrílico, tinta serigráfica e goma laca indiana sobre lona fixada em cabos de ferramenta agrícola cortados - 124x73,5 0 cm
Tome-se por exemplo a pintura "Criança que não brinca", de 2022.
A mensagem se liga ao trabalho infantil tão disseminado atualmente e cujo combate é uma necessidade social. A figura do menino, com sujeira inidentificável no rosto - poeira de mineração, cinzas de carvoaria, pesticida agrícola? - que torna sua face quase monocromática, afasta-o do mundo colorido da infância que se desfaz e derrete ao fundo. Os contornos de sua cabeça inacabados, sugerem a falha na formação de sua personalidade e para um crescimento saudável, pois que abandonou os jogos infantis, talvez os estudos, de forma compulsória pelas circunstâncias. Em mensagem quase subliminar, a estrutura da pintura a suportar a lona foi construída com cabos de ferramentas agrícolas - enxada talvez -, cortados. Essa prática é normal na agricultura familiar ou em atividades com exploração do trabalho infantil para que pessoas de menor estatura - crianças - usem as ferramentas.
Já o díptico "Meus pais", de 2022, é uma mensagem pessoal. Usei a serigrafia para demonstrar que meus pais sempre foram meus ídolos em todas as ocasiões. Meu pai, falecido em 2014, era um pai-exemplo e um exemplo de pai. Por isso a duplicação.
Minha mãe se multiplicava pela família. Ambos sempre presentes em qualquer cenário, representados pelo fundo variado.
A figura de meu pai velho expressa meu respeito, admiração. A experiência que sempre me transmitiu.
Minha mãe, jovem e bela, tento exprimir o amor que meu pai por ela sentia, pois que acredito que ele sempre a viu dessa forma, não importando a idade e as inevitáveis rugas.
Meus pais (2022)
Acrílico e serigrafia sobre tela - díptico 60x90 cm e 100x20 cm
Soldado vermelho (2022)
Acrílico sobre tela - 100x80 cm
No "Soldado vermelho", também de 2022, a mensagem pode ser considerada ambígua, pois ao mesmo tempo que pode ser dramática de uma forma não elogiosa, em recordação à recente guerra contra a Ucrânia, também pode ser inversa: soldados russos que libertaram campos de concentração nazistas e ajudaram a vencer a II Grande Guerra.
Mas e se, na realidade, a figura apenas lembre dos seriados e filmes branco-e-preto assistidos quando criança, com o tingimento da imaginação infantil? Ou os soldadinhos de plástico que serviam de apoio para os doces comprados em mercearia e bares?
A mensagem, conclui-se, pode ser variada.
A conclusão que há que se ter é que a mensagem não é uma exclusividade do artista. Ela pode - e todo artista apreciaria muito - trazer carga emocional do observador nela.
Essa emoção se juntaria a poesia intentada pelo artista.
Quer-se com essa digressão sugerir que se dispensem momentos - uma ou duas dezenas de segundos - para a observação das obras. Nesse tempo que se busque talvez a mensagem do artista ou a própria mensagem que, sem ter qualquer conhecimento, o artista imprimiu em sua obra.
Fala-se que a obra artística não é de ninguém, mas sim do mundo.
É uma verdade. Só os tolos não atentam para a arte.
Uma pintura abstrata pode levar o espectador a estados de concentração, de mindfulness, absolutamente ímpares, apenas com a observação de dois centímetros quadrados da obra.
E não importa se a conclusão seja "gostei/não gostei". Importa a tentativa.
O copo sempre estará meio cheio para alguns e meio vazio para outros. Mas nas duas situações, é possível aplacar a sede.
Que se pense a arte como uma vitamina que potencializa a alma.
Basta a observação e a busca pela mensagem.